O
interesse processual como pressuposto autónomo
O interesse em processual ou
interesse em agir consiste na indispensabilidade de o autor recorrer em juízo
para a satisfação da sua pretensão, quer isto dizer que o interesse processual
do autor da acção ou do requerente de qualquer providência judicial depende da
necessidade de obtenção do título judicial solicitado[1]. Porém
não basta haver necessidade de obter a tutela judicial para que haja interesse
processual ainda é necessário que a via jurisdicional seja a mais adequada para
alcançar aquela tutela, adequação essa que é verificada essencialmente em
função de critérios temporais e económicos[2]. Sendo
assim, uma parte não terá interesse processual na instauração de uma acção, se
depois de aferidos todos os meios disponíveis ficar comprovado que recorrendo a
outro meio processual ou extrapocessual, os resultados desejados revelar-se-ão
mais céleres e menos economicamente custosos.
Pode se assim concluir que o
interesse processual é um pressuposto aferido pela necessidade da tutela
judicial e pela adequação judicial empregue pela parte[3].
O interesse processual deve
distinguir-se da legitimidade, (art 9º CPTA) que nas palavras do professor
Miguel Teixeira de Sousa é o interesse direto, pessoal e legitimo em demandar
judicialmente (legitimidade activa que é a que releva para distinção em causa).
Dito assim, mesmo quando uma parte é
titular de um interesse directo, pessoal e legítimo para a proposição de uma
acção, não é suficiente para o preenchimento do interesse processual, logo não
ter direito de recorrer a tutela judicial para satisfação do seu direito, por
não ser necessário, ou existir meios mais adequados.
No CPTA o interesse processual não
aparece expressamente classificado como um pressuposto processual (como também
na lei processual civil, ao contrário de algumas leis processuais civis
estrangeiras, nomeadamente o alemão), porém tanto pela maioria da doutrina
(nomeadamente Vieira de Andrade, Miguel Teixeira de Sousa, Manuel Andrade,
Aroso de Almeida) como pela maioria da jurisprudência é tida como um
pressuposto processual autónomo da legitimidade.
Excepcionalmente, no acórdão do
Supremo Tribunal de Justiça de 12/4/1994 (processo 33395), dispõe que o
interesse processual não tem autonomia no contencioso administrativo (como
também no direito processual civil) integrando assim a legitimidade sendo uma
sua concretização, “o autor é parte legítima quando tem interesse directo em
demandar” interesse que se exprime pela “utilidade derivada da procedência da
acção” ou seja um elemento complementar da legitimidade ativa.
Descordamos dessa posição, porque
apesar do CPTA não classificar expressamente o interesse processual como
pressuposto, não faltam no seu texto referências directas (art 39º) e
indirectas (art 54º, 55º) que a autonomizam com um pressuposto.
O artigo 39º, não classifica o
interesse processual como um pressuposto, mas evidencia-o claramente que o
pressuposto interesse processual não se confunde com legitimidade, precisamente
num domínio em que assume maior relevo, a utilidade das acções meramente
declarativas ou simples apreciação que visam ocorrer a lesões efectivas,
resultantes do fundado receio da verificação de condutas lesivas num futuro
próximo, determinado por uma incorrecta avaliação da situação existente [4] “sendo
um dos domínios onde o interesse processual assume relevo” [5]
No artigo 55 nº1 alínea a) já não há
correspondência directa na letra da lei, mas há uma manifestação do interesse
processual todavia misturado com a questão da legitimidade. O caracter
“directo” do interesse tem haver com a questão de saber se existe um interesse
actual e efectivo em pedir a anulação ou declaração do acto impugnado. Partindo
do princípio que o impugnante é titular do interesse, tendo então legitimidade,
trata-se de saber se o impugnante se encontra numa situação efectiva de lesão
que justifique a utilização do meio impugnatório. O STA sustenta que o
interesse directo deve ser apreciado por referência ao conteúdo da petição
inicial em função das vantagens que o impugnante relega poderem advir-lhe da
anulação do acto, sendo que “os efeitos decorrentes da anulação devem
repercutir-se de forma directa e imediata na esfera jurídica do impugnante”,
tem assim assim legitimidade para impugnar quem “espera obter da anulação do
acto impugnado um certo beneficio, sendo de repercussão direta na esfera do
interessado.”[6]
O interesse direto contrapõe-se a um
interesse hipotético, que não é uma utilidade que possa advir diretamente da
anulação do caso impugnado.
Pode se concluir que, “o requisito
do caracter direto não tem haver com a legitimidade, mas com a questão de saber
se o alegado titular do interesse (sendo assim parte legitima) tem efectiva
necessidade de tutela jurídica[7]
O artigo 54ºn 2 é uma situação em
que o CPTA admite que mesmo os actos administrativos ineficazes podem
constituir situações de interesse agir, o que contraria as leis processuais
administrativas anteriores, como também sucede com artigo 39º que têm em vista
situações em que o interesse em agir se coloca em situações que ainda não
produziram efeito, nomeadamente situações de lesão efectiva resultantes de execução
ilegítima de acto ineficaz (54 nº2 alínea a), e situações de ameaça de lesão
(art 54 nº2 alínea b) o receio das consequências lesivas futuras que resultarão
da produção de efeitos e eventual execução do acto ineficaz.[8]
Analisando esses preceitos na lei
podemos concluir que o interesse processual é um pressuposto autónomo em
matéria do contencioso administrativo quer a nível principal, quer a nível
cautelar. Um pressuposto de certa forma ligado com a legitimidade, mas autónoma
desta.
Bibliografia:
Acórdão do Supremo Tribunal
Administrativo de 12/04/1994
,Acórdão pleno do STA 27/02/1996)
Aroso de Almeida, O novo regime do
processo nos tribunais Administrativos
Teixeira de Sousa, “Falta de
interesse processual no Contencioso Administrativo” Anotação do acórdão STA
06/05/1997 processo 42131, Revista de Direito Administrativo
Vieira de Andrade, A justiça
administrativa, Almedina 2017
[1] Teixeira
de Sousa, Falta de interesse processual no Contencioso Administrativo”
[2] Teixeira
de Sousa, Falta de interesse processual no Contencioso Administrativo”
[3] Teixeira
de Sousa, Falta de interesse processual no Contencioso Administrativo”
[4] Vieira
de Andrade, A Justiça Administrativa, Almedina 2007
[5] Vieira
de Andrade, A Justiça Administrativa, Almedina 2007
[6] Acordão
do STA 27/02/1996
[8] Vieira
de Andrade, A justiça administrativa, Almedina 2017
Silvio Medina Rodrigues
Aluno nº 26299
subturma 10
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