sábado, 3 de novembro de 2018

Comentário ao Acórdão Tribunal Central Administrativo - Norte de 09-10-2015 - decisão de recurso por caducidade de ação

       JM (requerente) interpôs recurso da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto. A decisão absolveu o Réu (Segurança Social) da instância, com a procedência de exceção de caducidade do direito de ação.

MATÉRIA DE FACTO

       JM aposentou-se por meio de um ato administrativo realizado a 16-08-2006. A pensão atribuída, foi calculada de uma forma errada, não foram considerados os anos contributivos correspondentes ao período de 1980- 1990.

O recorrente apresentou sucessivas reclamações[1] para serem corrigidos o número de anos para a formação da taxa da pensão. A Segurança Social, um ano depois da apresentação da primeira reclamação, reconheceu a existência de um período que não tinha sido contabilizado

No entanto, apesar de reconhecer a omissão dos anos a contabilizar, a Segurança Social permaneceu sem agir nem a transmitir qualquer resposta ao recorrente.

         Em 16-04-2008, o recorrente foi notificado de que havia sido aceite e reconhecido o período contributivo de novembro de 1986 a dezembro de 1988. Ou seja, não foi considerado a totalidade do período reclamado. O recorrente voltou a não concordar com a decisão e reclamou novamente junto da Segurança Social (desta vez com o patrocino de uma Advogada). O recorrente foi notificado a 15-10-2010, onde é comunicado atribuição da pensão segundo o novo cálculo. Porém, apesar da notificação na atribuição da pensão, foram apenas contabilizados 5 dos 10 anos reclamados.

       JM remeteu um pedido solicitando informações, à Segurança Social, a questionar se iriam ser contabilizados os anos que esteve receber um valor inferior ao devido. E nunca teve qualquer resposta.

         A defesa usou como argumento a identificação de um erro de interpretação dos factos e do disposto na al. a) do n.º2 e na al. a) do n.º 4 do artigo 58.º do CPTA. Para a defesa do recorrente foi induzido em erro, ao criarem uma convicção forte de que o processo estava a ser agilizado. Razão pela qual, não poderia ser exigível, a um cidadão normalmente diligente, a apresentação tempestiva da ação. 

         No entanto a interpretação e a decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, não foi essa, mas antes, considerou-se que o recorrente não se encontrava em erro. Pelo que o recorrente tinha três meses, para impugnar o ato administrativo, a contar da data em que o depósito do valor da pensão fosse efetuado, isto é, no dia 10-11-2010. 

Desta forma, o prazo terminaria a 21-02-2011. Agravado ainda por ser assistido por Advogada, que devia encontrava-se conhecedor de todo o processo e das implicações que acarretaria pelo não cumprimento do prazo supra.

         No entretanto o n.º4 do artigo 58º do CPTA foi revogado com o DL n.º 214-G/2015, de 2 de Outubro. O que origina que a conduta da administração que induza em erro um cidadão diligente, deixa de servir de fundamento à extensão do prazo de impugnação de um ato administrativo, até um ano.

         A pesar, do disposto no n.º4 do artigo 58º do CPTA ter sido revogado, a decisão do Tribunal Central Administrativo Norte assenta no facto de não nos encontrarmos perante um caso de impugnação de ato administrativo, mas sim de condenação á prática de ato devido. Neste sentido, o argumento de que o recorrente se encontrava em erro não tem cabimento.

Tendo em consideração:

         O recorrente intentou uma ação para o reconhecimento de um direito, solicitando a condenação do Réu ao reconhecimento de uma pensão a ser calculada em função de determinados períodos contributivos.

         Neste sentido, atendendo ao disposto na al. b) do n.º1 do artigo 37º e do n.º1 do artigo 66º do CPTA, dever-se-á aplicar o regime da condenação à prática de ato administrativo devido. 
Como primeiro pressuposto, para ser deduzido um pedido de condenação à prática de um ato é o interessado obrigado apresentar um requerimento,[2] que tenha constituído no órgão um dever de decidir – neste caso, a reclamação. Com a apresentação do requerimento dar-se-á a constituição de um dever de “praticar” na Administração ou “pelo menos para o efeito processual de habilitar o interessado à propositura da correspondente ação (…)[3].

         Atendendo ao disposto no n.º1 do artigo 67º do CPTA, a condenação à prática de ato administrativo pode ser pedida quando: apresentado o requerimento, se verificarem uma das situações enunciadas nas alíneas no n.º1[4].

         Assim, conforme refere o Tribunal Central Administrativo Norte na decisão de recurso, importa aferir se a notificação de 15-10-2010 para além de fixar o valor da pensão, indefere o pedido de verificação dos restantes períodos contributivos não contemplados. Caso indefira a verificação dos períodos, aplicar-se-á o disposto na al. b), do n.º1 do artigo 67º do CPTA e, por conseguinte, o prazo no n.º2 do artigo 69º do CPTA – 3 meses. Caso contrário, aplicar-se-á a al. a), do n.º1 do artigo 67º do CPTA e o prazo no n.º1 do artigo 69º do CPTA – 1 ano.

         Neste sentido, torna-se essencial aferir, num primeiro momento, qual é o pedido e, num segundo momento, se aquilo que foi pedido foi indeferido. O pedido foi a contabilização dos períodos contributivos supra referidos. Como resposta ao pedido, o requerente recebe por parte da Segurança Social, uma notificação onde consta o novo valor atualizado da pensão, com a discriminação dos períodos que foram contabilizados para o cálculo do valor final. Os períodos considerados não coincidem com os períodos solicitados. Será que os períodos não considerados foram indeferidos ?

         Segundo o Tribunal Central Administrativo Norte, a mera discriminação dos períodos que são contabilizados não constitui um indeferimento expresso dos restantes períodos. Assim, dever-se-á aplicar o disposto na al. a) do n.º1 do artigo 67º do CPTA. A administração deverá decidir o requerimento no prazo de 90 dias – artigo 128º do CPA – sob pena de ser considerada omissão pura e simples[5]
O Tribunal Central Administrativo Norte, ao considerar o não indeferimento do pedido do requerente aplicou o regime do n.º1 do artigo 69º do CPTA. Assim, não aplica o prazo de 3 meses mas sim o de 1 ano. O requerente poderia exercer o seu direito até 15-10-2011. 
Por outro lado, poder-se-á colocar a hipótese de considerar que a mera discriminação dos períodos que não são contabilizados, constitui um indeferimento expresso dos mesmos.
José Tavares de Almeida
23019



[1] VÁRIAS RECLAMAÇÕES
[2] Note-se, no caso em estudo não nos encontramos perante uma situação descrita no n.º4 do artigo 67º do CPTA. Caso contrario, poder-se-ia recorrer a um pedido de condenação à prática de ato devido sem a apresentação de um requerimento.
[3] Artigo 13º, n.º2 CPA se o mesmo interessado tiver colocado um requerimento com o mesmo pedido à menos de 2 anos pode ao responder. Aroso não concorda de houver mais fundamentos  
[4] O artigo 13º, n.º2 do CPA, consagra que se o mesmo interessado tiver colocado um requerimento com o mesmo pedido, há menos de 2 anos e tiver sido dada uma resposta expressa se a Administração não responder novamente, não se considera preenchido o pressuposto no n.º1 do artigo 67º do CPTA. O professor Mário Aroso de Almeida, considera que se existirem novos fundamentos, independentemente de já ter sido colocado um requerimento idêntico antes a Administração deverá dar uma resposta. Vide in MARIO AROSO DE ALMEIRA, Manual de Processo Administrativo, Almedina, 2016, 2ª edição, p.305 e ss.
[5] Vide in MARIO AROSO DE ALMEIRA, Manual de Processo Administrativo, Almedina, 2016, 2ª edição, p.311

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